6.4.05

Adeus ao Papa João Paulo II

Texto retirado do site www.midiasemmascara.org

"É com lágrimas nos olhos e tristeza no coração que escrevo este artigo, pois o papa João Paulo II acaba de falecer. Quem é católico como eu, e compreende a importância do papa, não apenas como referencial de vida mas como sucessor de São Pedro e vigário de Cristo na Terra, deve estar sentindo a mesma coisa. Até os cristãos de outras denominações, seguidores de outras religiões e mesmo aqueles que, infelizmente, não seguem nenhuma religião, têm motivos para estar pesarosos, pois a benigna influência do Santo Padre se estendeu para além do mundo católico.

Karol Jozef Woijtyla nasceu no dia 18 de maio de 1920, na cidade de Wadowice, sul da Polônia. O futuro papa viu seu país ser invadido pelo exército nazista, fato que deu início à Segunda Guerra Mundial. Poucos anos depois viu os nazistas serem derrotados apenas para serem substituídos pelo exército soviético, que impôs um regime comunista ao país.

Atleta e ator em sua juventude, João Paulo II entrou em um seminário clandestino na cidade de Cracóvia em 1942, sendo ordenado padre em 1946. Em 1948 conclui o doutorado em teologia e dez anos depois foi sagrado bispo. Participou ativamente do Concílio Vaticano II (1962-1965) e pouco tempo depois, em 1967 foi nomeado cardeal pelo papa Paulo VI. Por fim, foi eleito papa pelo Colégio de Cardeis no dia 16 de outubro de 1978, após o breve papado de João Paulo I.

Poucos dias depois de se tornar papa, João Paulo II enviou uma mensagem para seu país natal, a Polônia: “Quero muito estar com vocês no 900º aniversário do martírio de São Estanislau” (padroeiro da Polônia). No ano seguinte, quando chegou a data, Sua Santidade cumpriu a sua promessa e visitou os poloneses. Multidões de mais de um milhão de pessoas se aglomeraram para ver o papa, que aproveitou para mandar uma mensagem não só para seus compatriotas, mas para todos aqueles que viviam sob a Cortina de Ferro: “Não é preciso ter medo, as fronteiras têm que ser abertas”. Um ano depois o Solidariedade era fundado. Finalmente, em 1989, ocorreram as primeiras eleições livres desde a implantação do comunismo. Das 262 cadeiras do Senado, 261 ficaram com o Solidariedade. Dois meses depois, o regime comunista caiu na Polônia e nos meses seguintes a Cortina de Ferro veio abaixo.

Sua oposição combativa ao comunismo quase lhe custou a vida. No dia 13 de maio de 1981, João Paulo II sofreu um atentado em plena Praça de São Pedro que quase o matou. Recentemente foi revelado que o turco Mehmet Ali Agca foi contratado para assassiná-lo pelo serviço secreto búlgaro, que por sua vez havia recebido tal ordem diretamente da União Soviética.

Além de enfrentar os regimes comunistas então estabelecidos no mundo, Sua Santidade também teve que lutar contra doutrinas inspiradas no comunismo que se imiscuíam dentro da própria Igreja Católica, debaixo do rótulo de “Teologia da Libertação”. Já em 1979 o papa declarou que “a Teologia da Libertação é uma teoria falsa”. Nos anos seguintes adotou uma forte posição contra o segmento do clero adepto de tal posição e conseguiu diminuir consideravelmente a influência deles.

Frente ao relativismo e niilismo do mundo moderno, Sua Santidade reafirmou várias vezes a validade dos ensinamentos cristãos. João Paulo II criticou várias vezes o que denominou “cultura da morte” do mundo moderno, que prega o aborto e a eutanásia. É importante lembrar que, além de meras palavras, a vida do Santo Padre foi um grande testemunho contra essa cultura da morte. Além disso, o papa reafirmou várias vezes a santidade do casamento, atacando as propostas de legalização do casamento entre homossexuais.

João Paulo II foi o papa que mais viajou, o que lhe valeu a alcunha de “o papa peregrino”. Ao Brasil veio três vezes, em 1980, 1991 e 1997. Foi também à África e visitou Jerusalém. Em 1983 tornou-se o primeiro papa a visitar uma sinagoga.

O pontificado de João Paulo II foi o terceiro maior de toda a história e certamente ainda causará grande influência não apenas na Igreja Católica, mas no mundo inteiro. Durante os últimos 26 anos o Santo Padre foi um farol para aqueles que têm fé, um porto seguro para os homens de bem e um grande condutor da barca de São Pedro.

Segundo o cardeal Camillo Ruini, o papa, o servo dos servos de Deus, enfrentou a prova mais difícil de sua vida com serenidade e abandono, confiando nas mãos de Deus. Serenidade que com certeza surge da esperança, esperança nas promessas de Cristo: “Em verdade, eu te digo, hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc. 23, 43), e nas palavras de São Paulo, “pois para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro”. (Fil. 1,21).

Que o exemplo que o papa nos deu com sua vida e morte continue a inspirar multidões. E que Deus acolha em Seu seio o servo dos seus servos."

Sarau Paraíso III

O retorno!

Depois da máquina do Tales, dos poemas do Plínio, dos milhares de texto do Veríssimo e das músicas bregas dos anos 80, chegou a vez de você mostrar a sua arte, ou a arte de outrem. Ou mostrar o que não é arte.

Afinal, o que é arte?

Propomos a responder essa questão, mas não de forma teórica. Vamos respondê-la na PRÁTICA! Neste domingo (um dia da semana bem agitado!!!)!!!!

Pedimos que traga uma foto para colocar no nosso mural para termos recordação de todos os freaks (artista é meio louco mesmo!) que passaram por lá! Bom, já que é pra trazer uma foto, pode levar na bagagem desenhos, pinturas e poesias. Tudo vai para o mural!!!

Mestre de Cerimônia:

Mc Serginho (e lacraia)! Afe..... Brincadeira!
Mc Mister Gordo

O lugar, o dia etc.:
10 de abril, Domingo
Das 15h às 18h30

Rua Abílio Soares, 145 - Salão de Festa (próximo à estação Paraíso)

Custo: DE GRAÇA!!!!! mas aceitamos contribuições voluntárias para pagar o salão!

Fotos da 1ª Edição:



Inscrições e Confirmações:

Você pode confirmar sua presença ou se inscrever para apresentar com o próprio Gordo, no telefone: 8391-0227, ou via e-mail: jucomics@ig.com.br ou solucio@uol.com.br!!!!

1.4.05

Divagação sobre as ilhas

Carlos Drummond de Andrade

Quando me acontecer alguma pecúnia, passante de um milhão de cruzeiros, compro uma ilha; não muito longe do litoral, que o litoral faz falta; nem tão perto, também, que de lá possa eu aspirar a fumaça e a graxa do porto. Minha ilha (e só de a imaginar já me considero seu habitante) ficará no justo ponto de latitude e longitude que, pondo-me a coberto dos ventos, sereias e pestes, nem me afaste demasiado dos homens nem me obrigue a praticá-los diuturnamente. Porque esta é a ciência e, direi, a arte do bem viver; uma fuga relativa, e uma não muito estouvada confraternização.

De há muito sonho esta ilha, se é que não a sonhei sempre. Se é que a não sonhamos sempre, inclusive os mais agudos participantes. Objetais-me: “Como podemos amar as ilhas, se buscamos o centro mesmo da ação?” Engajados, vosso engajamento é a vossa ilha, dissimulada e transportável. Por onde fordes, ela irá convosco. Significa a evasão daquilo para que toda alma necessariamente tende, ou seja, a gratuidade dos gestos naturais, o cultivo das formas espontâneas, o gosto de ser um com os bichos, as espécies vegetais, os fenômenos atmosféricos. Substitui, sem anular. Que miragens vê o iluminado no fundo de sua iluminação?... Supõe-se político, e é um visionário. Abomina o espírito de fantasia, sendo dos que mais o possuem. Nessa ilha tão irreal, ao cabo, como as da literatura, ele constrói a sua cidade de ouro, e nela reside por efeito da imaginação, administra-a, e até mesmo a tiraniza. Seu mito vale o da liberdade nas ilhas. E, contentor do mundo burguês, que outra coisa faz senão aplicar a técnica do sonho, com que os sensíveis dentre os burgueses que se acomodam à realidade, elidindo-a?

A ilha que traço agora a lápis neste papel é materialmente uma ilha, e orgulha-se de sê-lo. Pode ser abordada. Não pode ser convertida em continente. Emerge do pélago com a graça de uma flor criada para produzir-se sobre a água. Marca assim o seu isolamento, e como não tem bocas de fogo nem expedientes astuciosos para rechaçar o estrangeiro, sucede que este isolamento não é inumano. Inumano seria desejar, aqui, dos morros litorâneos, um cataclismo que sovertesse tão amena, repousante, discreta e digna forma natural, inventada para as necessidades de ser no momento exato em que se farta de seus espelhos, amigos como inimigos.

E por que nos seduz a ilha? As composições de sombra e luz, o esmalte da relva, a cristalinidade dos regatos — tudo isso existe fora das ilhas, não é privilégio dela. A mesma solidão existe, com diferentes pressões, nos mais diversos locais, inclusive os de população densa, em terra firme e longa. Resta ainda o argumento da felicidade — “aqui eu não sou feliz”, declara o poeta, para enaltecer, pelo contraste, a sua Pasárgada: mas será que se procura realmente nas ilhas uma ocasião de ser feliz, ou um modo de sê-lo? E só se alcançaria tal mercê, de índole extremamente subjetiva, no regaço de uma ilha, e não igualmente em terra comum?

Quando penso em comprar uma ilha, nenhuma dessas excelências me seduz mais que as outras, nem todas juntas constituem a razão de meu desejo. Sou pouco afeiçoado à natureza, que em mim se reduz quase que a uma paisagem moral, íntima, em dois ou três tons, só que latejante em todas as partículas. A solidão, carrego-a no bolso, e nunca me faltou menos do que quando, por obrigações de ofício, me debruçava incessantemente sobre a vida dos outros. E felicidade não é em rigor o que eu procuro. Não. Procuro uma ilha, como já procurei uma noiva.

A ilha me satisfaz por ser uma porção curta de terra (falo de ilhas individuais, não me tentam aventuras marajoaras), um resumo prático, substantivo, dos estirões deste vasto mundo, sem os inconvenientes dele, e com a vantagem de ser quase ficção sem deixar de constituir uma realidade. A casa de campo é diferente. A continuidade do solo torna-a um pobre complemento dessas propriedades individuais ou coletivas, públicas ou particulares, em que todo o desgosto, toda a execrabilidade, toda a mesquinhez da coisa possuída, taxada, fiscalizada, trafegada, beneficiada, herdada, conspurcada, se nos apresenta antes que a vista repare em qualquer de seus eventuais encantos. A casa junto ao mar, que já foi razoável delícia, passou a ser um pecado, depois que se desinventou a relação entre homem, paisagem e moradia. Tudo forma uma cidade só, torpe e triste, mais triste talvez que torpe. O progresso técnico teve isto de retrógrado: esqueceu-se completamente do fim a que se propusera, ou devia ter-se proposto. Acabou com qualquer veleidade de amar a vida, que ele tornou muito confortável, mas invisível. Fez-se numa escala de massas, esquecendo-se do indivíduo, e nenhuma central elétrica de milhões de kw será capaz de produzir aquilo de que precisamente cada um de nós carece na cidade excessivamente iluminada: uma certa penumbra. O progresso nos dá tanta coisa, que não nos sobra nada nem para pedir nem para desejar nem para jogar fora. Tudo é inútil e atravancador. A ilha sugere uma negação disto.

A ilha deve ser o quantum satis selvagem, sem bichos superiores à força e ao medo do homem. Mas precisa ter bichos, principalmente os de plumagem gloriosa, com alguns exemplares mais meigos. As cores do cinema enjoam-nos do colorido, e só uma cura de autenticidade nos reconciliará com os nossos olhos doentes. Já que não há mais vestidos de cores puras e naturais (de que má pintura moderna se vestem as mulheres do nosso tempo?), peçamos a araras e periquitos, e a algum suave pássaro de colo mimoso, que nos propiciem as sensações delicadas de uma vista voluptuosa, minudente e repousada.

Para esta ilha sóbria não se levará bíblia nem se carregarão discos. Algum amigo que saiba contar histórias está naturalmente convidado. Bem como alguma amiga de voz doce ou quente, que não abuse muito dessa prenda. Haverá pedras à mão — cascalho miúdo — que se possa lançar ao céu, a título de advertência, quando demasiada arte puser em perigo o ruminar bucólico da ilha. Não vejo inconveniente na entrada sub-reptícia de jornais. Servem para embrulho, e nas costas do noticiário político ou esportivos há sempre um anúncio de filme em reprise, invocativo, ou qualquer vaga menção a algum vago evento que, por obscuro mecanismo, desperte em nós fundas e gratas emoções retrospectivas. Nossa vida interior tende à inércia. E bem-vinda é a provocação que lhe avive a sensibilidade, impelindo-a aos devaneios que formam uma crônica particular do homem, passada muitas vezes dentro dele, somente, mas compensando em variedade ou em profundeza o medíocre da vida social.

Serão admitidos poetas? Em que número? Se foram proscritos das repúblicas ideais e das outras, pareceria cruel bani-los também da ilha de recreio. Contudo, devem comportar-se como se poetas não fossem: pondo de lado os tiques profissionais, o tecnicismo, a excessiva preocupação literária, o misto de esteticismo e frialdade que costuma necrosar os artistas. Sejam homens razoáveis, carentes, humildes, inclinados à pesca e à corrida a pé, saibam fazer alguma coisa simples para o estômago, no fogão improvisado. Não levem para a ilha os problemas de hegemonia e ciúme.

*

Por aí se observa que a ilha mais paradisíaca pede regulamentação e que os perigos da convivência urbana estão presentes. Tanto melhor, porque não se quer uma ilha perfeita, senão um modesto território banhado de água por todos os lados e onde não seja obrigatório salvar o mundo.

A idéia de fuga tem sido alvo de crítica severa e indiscriminada nos últimos anos, como se fosse ignominioso, por exemplo, fugir de um perigo, de um sofrimento, de uma caceteação. Como se devesse o homem consumir-se numa fogueira perene, sem carinho para com as partes cândidas ou pueris dele mesmo, que cumpre preservar principalmente em vista de uma possível felicidade coletivista no futuro. Se se trata de harmonizar o homem com o mundo, não se vê porque essa harmonia só será obtida através do extermínio generalizado e da autopunição dos melhores. Pois afinal, o que se recomenda aos homens é apenas isto: “Sejam infelizes, aborreçam o mais possível aos seus semelhantes, recusem-se a qualquer comiseração, façam do ódio um motor político. Assim atingirão o amor.” Obtida a esse preço a cidade futura, nela já não haveria o que amar.

Chega-se a um ponto em que convém fugir menos da malignidade dos homens do que da sua bondade incandescente. Por bondade abstrata nos tornamos atrozes. E o pensamento de salvar o mundo é dos que acarretam as mais copiosas — e inúteis — carnificinas.

Estas reflexões descosidas procuram apenas recordar que há motivos para ir às ilhas, quando menos para não participar de crimes e equívocos mentais generalizados. São motivos éticos, tão respeitáveis quanto os que impelem à ação o temperamento sôfrego. A ilha é meditação despojada, renúncia ao desejo de influir e de atrair. Por ser muitas vezes uma desilusão, paga-se relativamente caro. Mas todo o peso dos ataques desfechados contra o pequeno Robinson moderno, que se alongou das rixas miúdas, significa tão-somente que ele tinha razão em não contribuir para agravá-las. Em geral, não se pedem companheiros, mas cúmplices. E este é o risco da convivência ideológica. Por outro lado, há um certo gosto em pensar sozinho. É ato individual, como nascer e morrer.

A ilha é, afinal de contas, o refúgio último da liberdade, que em toda parte se busca destruir. Amemos a ilha.